RESÍDUOS
PROGRAMA DE CINEMA
exd'11 / cinemateca portuguesa - museu do cinema
2 Novembro a 9 Dezembro
Wie Macht Man Glas (Handwerklich), Peter Nestler
Programa
Calendário das sessões
SESSÃO 1 / Quarta-feira, 2 de Novembro, 19:30
O filme de Jean-Daniel Pollet é um testemunho "para memória" das técnicas e dos gestos de produção numa antiga forja, nos seus últimos dias de actividade. São dois dias numa forja aberta em 1876. O filme é uma última homenagem ao trabalho ancestral dos operários que falam dos seus gestos que repetiram durante anos e sobre uma actividade em vias de desaparecer. Seguimos passo a passo cada uma das fases de fabrico de um objecto: do molde em areia na manhã até ao objecto final à tarde, sem ignorar o momento belo e solene quando a fonte incandescente preenche o molde, expandindo-se.
SESSÃO 2 / Sexta-feira, 4 de Novembro, 22:00
Uma sessão que reúne filmes diferentes sob a ideia do excesso e restos da produção: fagulhas, limalha, poeiras, energia dispendida. O filme produzido pela Gaumont em 1910 é um dos primeiros documentos conhecidos sobre a produção do aço e pretende representar a intensidade da produção e as condições na fábrica através de imagens do fogo pintadas à mão.O filme de Richard Serra faz parte de uma série de filmes sobre os gestos do trabalho e os materiais de produção (uma reflexão paralela à própria prática de Serra como escultor) – neste filme quatro mãos limpam e raspam limalhas de metal até não ficar nada no chão. A imagem reduz-se a uma acção sequencial em que cada vez mais energia é dispendida para levar a cabo aquilo que parece exigir menos esforço. O documentário de Franju, Poussiéres, foi uma encomenda do Instituto Nacional de Pesquisa sobre a Segurança, para que o realizador realizasse um filme breve com o propósito de treinar os trabalhadores na protecção contra o pó industrial, responsável por inúmeras doenças no trabalho. Richard Serra e a historiadora de arte Clara Weyergraf rodaram Steelmill / Stahlwerk em Heinrichhütte em Hattingen, onde Serra costumava fabricar as suas esculturas em ferro, até ao fim deste projecto, em 1987. Um filme silencioso, impressionante (que cita directamente Entusiasmo de Dziga Vertov) e que justapõe as forças da maquinaria violenta e a escala humana, mostrando o imenso esforço físico dos trabalhadores metalúrgicos. Winter Solstice é um dos filmes que compõem o ciclo “Magellani” de Hollis Frampton e é um exercício de montagem a partir de imagens captadas numa fábrica de aço no Milwaukee. Uma citação directa dos filmes de Eisenstein e Vertov, bem como da obra de pintores abstractos como Frank Stella ou Rothko, o filme de Frampton capta o trabalho do metal como uma explosão de energia, focando-se sobretudo nas imagens do fogo, das partículas soltas da produção.
SESSÃO 3 / Quarta-feira, 9 de Novembro, 19:30
Quatro filmes reunidos sob a ideia da relação com o passado, com a força primordial das coisas inexplicáveis e que resistem à erosão, entre a noite e o dia. Landscape for Fire foi o primeiro filme de Anthony McCall e é o registo de uma das suas acções no exterior, filmando a precipitação de pequenos fogos nocturnos dentro de uma superfície geométrica, com uma atenção particular dada ao som. McCall abandonou muito cedo a forma clássica do cinema, preferindo trabalhar espacialmente a relação entre a luz (dos projectores) e os espectadores centrando a sua atenção na experiência concreta dos materiais do filme. O filme de Duras é um traveling pelas ruas de Paris ao raiar do dia e é uma declaração de amor por todos aqueles que foram esquecidos e deixados para trás – dirige-se aos trabalhadores imigrantes, aos que não têm abrigo, à população clandestina de uma cidade que ainda dorme, com os seus monumentos e edifícios históricos como pano de fundo para esta declaração for a do tempo real: "Chamamos mãos negativas às pinturas de mãos encontradas nas grutas da Europa Sub-Atlântica. O contorno dessas mãos – pousadas, grandes e abertas sobre a pedra – era coberto de cor. Sobretudo de azul, de preto. Por vezes de vermelho. Não se encontrou nenhuma explicação para essa prática.” (Duras) O filme de Raymonde Carasco e Régis Hebraud, é parte do fresco Taharumaras e filma a preparação das encenações da Paixão na aldeia de Norogachic no México. O filme alterna as sequências nocturnas, filmadas a preto e branco, com as sequências a cores das pinturas corporais e das danças diurnas, acompanhadas da leitura de um texto de Antonin Artaud.
“Na Primavera de 1958, na região petrolífera do Khuzistão, no coração da indústria petrolífera iraniana e da civilização persa, um poço de gás explode durante uma perfuração. A fonte é inesgotável, o fogo potente, indestrutível e gigantesco. É um dragão. Em todo o caso é assim que aparece em Un Feu. Este documentário, filmado com uma Bolex de 16mm, na urgência do acontecimento, é de facto bem mais do que a narrativa da catástrofe. A força do filme deve-se aos seus encontros bastante contrastados e no entanto tão próximos, entre o real e o imaginário, o dia e a noite, infinitamente grande e infinitamente pequeno, entre o ranger do metal, o estertor surdo do fogo e o canto dos homens, o que é selvagem e o que está domado, o seco e o fértil. Um Fogo recompõe a comunidade humana, a potência ancestral dos astros, uma terra por vir.” (Stéfani de Loppinot)
SESSÃO 4 / Quinta-feira, 24 de Novembro, 22:00
Sessão apresentada por Klaus Wyborny
O primeiro filme da sessão é um curto documentário que apresenta imagens das obras de Robert Smithson que envolveram o despejo de substâncias viscosas como cola, asfalto e cimento em diversos locais. Um comentário de Smithson ajuda a perceber o seu objectivo ao fazer estes trabalhos, clarificando o seu interesse geral pela entropia, pelo tempo geológico, pela anti-forma, pelo uso de materiais industriais e em retirar a obra de arte do espaço da galeria confrontando-a com a oposição exterior.
Thom Andersen escreveu acerca do filme Studien zum Untergang des Abendlands: “O último flicker de Wyborny concentra-se em fábricas, aterros industriais, vias fluviais, paisagens urbanas e nos espaços entre eles, e possui uma resonância emocional estranha. É ‘sereno, à maneira das formigas’ – para citar o título da segunda secção -, mas também é elegíaco e melancólico. Tal como dois outros "teimosos" (Godard e Straub), o realizador permanece fiel às suas ideias sobre a composição fílmica, geradas ao longo de muitos anos, dando-nos um vislumbre de um cinema utópico.” (Thom Andersen, Film Comment, Jan 2011) No filme musical de Wyborny, o último deste realizador, um dos mais importantes cineastas experimentais alemães, cada som transporta consigo uma nova imagem: são ao todo 6299 planos montados directamente na sua câmara em Super-8. Uma viagem intoxicante e estroboscópica pelas paisagens industriais, naturais e urbanas da África Oriental, Nova Iorque, da região do Ruhr e por Rimini. Este filme musical experimental refere-se à obra filosófica escrita em 1918 por Oswald Spengler A Decadência do Ocidente. O pessimismo cultural de Spengler reclama que o progresso não é mais do que uma ilusão e que a era moderna não traz grandes vantagens - as pessoas deixam de ser capazes de compreender a racionalidade do mundo. Cada nota do piano e do vibrato do violino evoca uma nova imagem: prédios demolidos, destroços, destruição e natureza.
SESSÃO 5 / Sexta-feira, 25 de Novembro, 22:00
Em Coreopsis, Pat O’Neill faz um filme abstracto, demonstrando a sua mestria na manipulação das imagens na impressora óptica – é um filme “manual”, inspirado por uma memória de família, um envelope endereçado à sua mãe com sementes de coreopsis nos anos 30.
Hartmut Bitomsky escreveu acerca do seu filme Pó: “Uma partícula de pó é apenas perceptível a olho nu. É o tema mais pequeno acerca do qual se pode fazer um filme – é um meio de desaparecimento e um critério de percepção. Onde quer que vamos, leva-nos a melhor; para onde quer que seja que nos viremos, segue-nos. É o nosso passado, o nosso presente e o nosso futuro. É universal e tem um nome em todas as línguas. Mantém ocupadas as donas-de-casa, bem como os cientistas, inventores, artistas e ramos industriais que a ele se dedicam. Acusam-no de alimentar vermes e causar doenças. Torna-se dono daquilo que é nosso, penetra nos laboratórios, cria planetas e galáxias. Estamos rodeados por ele, está dentro de nós e livramo-nos dele. Aninha-se no desespero da sua própria existência”. Ao examinar muitos tipos de pó, incluindo partículas microscópicas invisíveis a olho nu, Pó ausculta uma variedade de cientistas – botânicos, biólogos, meteorologistas e astrónomos – que investigam as consequências sanitárias e ambientais do pó, desde as tempestades de areia do Sahara à dust bowl dos anos 30 no Oklahoma, ao pó tóxico gerado na demolição das torres do World Trade Centre. Os aspectos fenomenológicos, filosóficos e mesmo artísticos da cultura do pó são explorados em entrevistas com artistas e coleccionadores. Ao examinar em detalhe algo que nos rodeia na nossa vida do dia-a-dia mas ao qual não prestamos grande atenção, Pó dá-nos uma nova apreciação do modo como este afecta o nosso corpo, o ambiente e mesmo o cosmos, permitindo-nos uma outra forma de ver o mundo.
SESSÃO 6 / Segunda-feira, 28 de Novembro, 19:30
Wasser und Wogen é um filme-compilação sobre a formação do “ciclo da água” e sobre diversas características e facetas desse elemento: desde a evaporação à sua utilização diversa. O realizador austríaco Albrecht V. Blum via-se sobretudo como um montador, que organizava material documental pré-existente em novos contextos. Esta obra-prima contribuiu para o desenvolvimento do filme-compilação e constitui uma perspectiva poética sobre o tema da água.
“Talvez o mais oportuno e essencial filme de vanguarda dos anos recentes, o tour-de-force silencioso de Peter Hutton, At Sea, segue o nascimento, a vida e a morte de um barco de mercadorias. Baixando significativamente o custo do comércio internacional, o “contentor” tem sido um instrumento vital para a constituição das redes correntes do capitalismo global. Em At Sea Hutton foca a sua câmara na infra-estrutura de transporte sublinhando a revolução dos contentores de barcos e oferecendo uma contribuição importante para a cartografia do presente. Começa com a construção dos navios mercantes na Coreia do Sul, um processo que acontece numa escala de tal modo grandiosa e épica que parece transcender os limites dos humanos que parecem partículas junto ao casco dos navios. A secção do meio acompanha a viagem de um barco enquanto cruza o oceano de Montreal até Hamburgo. Tal como nas fotografias de Allan Sekula, o filme de Hutton regista a tensão entre as abordagens romântica e funcionalista ao barco de mercadorias. Tendo trabalhado na marinha mercante na sua juventude, Hutton é sensível ao romance da viagem oceânica e à sublimidade do mar, uma resposta estética com raízes literárias e visuais profundas. Mas quando a câmara olha para o arco chuvoso do barco, as inúmeras pilhas de contentores com cores fortes sublinham que o propósito da viagem é a circulação de bens de consumo e não de humanos e da sua imaginação. Esses cálculos económicos tornam-se cruelmente mais explícitos na secção que conclui o filme, e que se passa numa praia em Bangladesh, um aterro pós-apocalíptico onde, abandonados na areia, os barcos que foram condenados a não ter mais utilidade são desmantelados recorrendo a perigosas técnicas pré-industriais. Quando tudo o que tem valor tiver sido removido, os barcos são abandonados como as carcaças das baleias, fósseis enferrujados envelhecidos prematuramente pelas necessidades fluctuantes do capital.” (Brian Rajski, Retentional Finitude).
SESSÃO 7 / Sexta-feira, 2 de Dezembro, 22:00
Estes três filmes colocam em acção formas particulares de crítica e paródia dos hábitos de consumo e do seu excesso. In Quest of Meat Joy é um filme feito a partir da performance homónima de Carolee Schneemann, descrito pela artista da seguinte forma: “Teatro do contacto físico: beliscar, lamber, pontapear, pintar e esculpir o corpo uns dos outros, espontaneamente libertos para rir e gritar. Chorar, instruir, discutir no âmbito do processo actual de performance… Trabalho com pessoas sem treino e com vários desperdícios e materiais tecnológicos para produzir imagens que vão do banal ao fantástico – imagens que movem, compõem e envolvem os nossos sentidos, expandindo-os para o desconhecido e para relações imprevisíveis.” Gordon Matta-Clark desenvolve com humor em Fresh Kill o seu interesse pela matéria e pelos dejectos da produção, encenando a destruição do seu carro num confronto épico: “Gordon propôs um filme que replicava os filmes antigos de monstros em que dinossauros batalhavam com Godzilla até à morte. O filme acontece numa lixeira em Fresh Kills na Ilha de Staten e mostra uma batalha até à morte entre o camião de Gordon, chamado Herman Meydag e, não uma, mas duas retro.escavadoras. Filmado em cores gloriosas por Burt Spielvogel e Rudy Burkhardt, termina com os restos amarfanhados de Herman Meydag a serem transportados para o pôr-do-sol para serem ignominiosamente despejados no aterro.” (Jane Crawford)
Ron Rice é uma das personalidades mais fulgurantes do cinema underground norte-americano da década de 60 e os poucos filmes que realizou são celebrações anárquicas e subversivas, paródicas e elegíacas, entre a poesia Beat e o hedonismo psicadélico. The Queen of Sheba Meets the Atom Man foi descrito por Alberto Moravia do seguinte modo: “o filme descreve, poeticamente, uma forma de vida. O filme é um protesto que é violento, infantil e sincero – um protesto contra um mundo industrial baseado no ciclo de produção e consumo.” As deambulações de Taylor Mead e Winifred Bryan por uma Nova Iorque crepuscular (com uma visita à mítica exposição The Future e aos seus protótipos que pretendiam mostrar “A Energia Atómica em Acção”), os seus jogos infantis, a interacção com os outros participantes no filme (com Jack Smith, por exemplo) a forma como todos os objectos parecem desafiar o seu uso, numa poesia muito particular do uso das coisas e das relações humanas, tornam o filme inesquecível.
SESSÃO 8 / Segunda-feira, 5 de Dezembro, 22:00
Ernie Gehr é um dos mais importantes cineastas norte-americanos e a cidade tem um papel fundamental em muitos dos seus filmes. Nestes dois títulos a ideia de resíduo surge de forma diversa – no primeiro, o realizador retoma um filme que realizou na década de 60, explorando a tensão entre a imagem fixa e em movimento, a possibilidade de se aproximar da matéria do filme e a intensidade expressiva da representação (uma demolição que estando em segundo plano, parece funcionar como câmara de eco para as intervenções no filme); no segundo explorando a história como remanescente, no seu primeiro filme realizado na Europa, na sua primeira viagem a Berlim, num filme que marcaria uma mudança significativa na sua obra. Michael Snow escreveu sobre REVERBERATION: “é uma desaceleração com textura, um esvaziamento e a identificação de um lugar. A relação entre o som e a imagem é uma das mais intensas que já experimentei: o som tem uma massa, é um contínuo, duro. Esta mancha densa a preto e branco é igualada por uma imagem granulosa (um baixo relevo, mas não de planos ou arredondamentos). Alude-se à equação entre tom e luz através de transformações constantes. Movimentos. Os movimentos tornam-se mais lentos, solenes e no entanto o filme tem um belo “senão”: vemos e ouvimos os átomos revoltos por baixo das imagens das ruas, dos prédios, das pessoas.”” SIGNAL – GERMANY ON THE AIR é o filme de um reconhecimento, uma tentativa para perceber a estrutura mental da organização de uma cidade na sua relação com os resíduos do seu passado. “Em Signal-Germany on the Air” é a história que ‘está no ar’, atrás da máscara de cada rosto, cada fachada, cada sinal na rua” (Daniel Eisenberg).
SESSÃO 9 / Terça, 6 de Dezembro, 22:00
Realizado por um dos principais documentaristas japoneses, Tsuchimoto Noriaki, SHIRANUI KAI é um dos vários filmes que realizou ao longo de 35 anos, explorando as consequências dos desastres ambientais, sobretudo aqueles associados com a doença de Minamata, resultante do despejo de mercúrio no mar de Shiranui no Sudoeste do Japão. Os filmes de Tsuchimoto tiveram um papal crucial na visibilidade dos efeitos a longo prazo do envenenamento por mercúrio, exigindo a responsabilização das empresas envolvidas. SHIRANUI KAI é o retrato de uma comunidade e uma região que vive (muitas vezes em negação) sob as consequências horrendas da negligência industrial. A relação de Tsuchimoto com as pessoas que filma, a elegância do seu olhar e a relevância contínua da questão, fazem deste filme uma obra-prima.
SESSÃO 10 / Quarta-feira, 7 de Dezembro, 22:00
“Uit het rijk der kristallen é um filme de micro-cinematografia que mostra diversas substâncias químicas a transformar-se em cristais brilhantes. Em 1929, respondendo a um convite de Abel Gance, o filme foi mostrado num cinema de vanguarda em Paris, onde foi referido como o último grito em cinema puro. (…) O filme oferece um estudo de doze minutos sobre cristais, combinando o trabalho sobre o ritmo abstracto com a transformação de cristais em paisagens microscópicas. Diferente de mostrar vida orgânica em tempo-real abstracto, este enquadramento micro-cinematográfico de químicos para exprimir a imagem em movimento como um pulsar e como a transformação de uma forma plástica.”
Cornouailles foi o último filme de Pierre Perrault e constitui uma coda à sua obra, um retrato do seu país a partir das convenções do filme sobre a natureza e os animais, num retrato da paisagem gelada do norte do Canadá e da vida e hábitos do boi almiscarado. “O filme começa com um espantoso plano longo da grande vastidão branca de neve varrida pelo vento e pontuada de formações rochosas negras. Nesta vastidão um boi almiscarado percorre o seu caminho despreocupado para se juntar a outro animal. O comentário serve de correcção ao primeiro filme [o filme anterior realizado por Perrault na mesma zona]: “Para percebermos melhor o boi almiscarado, talvez tenhamos de conhecer primeiro o glaciar, esse imenso sarcófago de todos os nossos passados.” A câmara afasta-se para revelar a parede de gelo que é a última fronteira do território do animal. É perante esse exemplo assombroso de mineralidade, está o gigante, ameaçador, “enigmático boi almiscarado” na sua terra natal “ao sul do gelo e ao norte da neve”. Depois Perrault embarca na glorificação da sua terra natal. A neve é eulogizada pela enumeração aparentemente sem fim de epítetos para a descrever e às suas formas; depois é a vez do derreter sazonal dos bordos do glaciar. Com este sustento, os líquenes são uma prova do mundo vegetal incrustado no mundo geológico (nas rochas) e no mundo animal (os chifres). O ciclo das flores mais vulneráveis é revelado, desde o botão até ao esqueleto descolorado e finalmente descobrimos a saxífraga violeta abrigada nos restos de um boi almiscarado.” (David Clandfield)
SESSÃO 11 / Sexta-feira, 9 de Dezembro, 22:00
Sobre imagens e fotografias de imóveis e objectos específicos da paisagem urbana e sem qualquer presença humana, em CONTRE-COURANT, uma voz fala-nos da procura de uma coisa que desconhece e que se esconde da vista de todos em Paris. O filme parte do desaparecimento do rio Bièvre para falar dos problemas de poluição dos cursos de água e dos subúrbios parisienses. Memo Mori é uma viagem através da zona londrina de Hackney e um filme sobre a perda e o desaparecimento. Uma viagem de barco no canal, as cabanas dos lotes de Manor Garden em Hackney Wick, demolição, realojamento, uma viagem de autocarro turístico através do parque Olímpico de Londres e o funeral de um membro dos Hell’s Angels assinalam uma mudança sísmica na topografia do leste de Londres. O filme é uma montagem de fragmentos filmados ao longo dos últimos três anos em Hackney e cada secção corresponde a uma observação de algo que que foi ou vai ser erradicado da paisagem. A acompanhar as imagens ouvimos o comentário e a leitura de excertos do livro Hackney, That Red Rose Empire de Ian Sinclair. Sobre ele escreveu Yann Lardeau: “três estratos históricos, três exemplos de uma revolução industrial passada. Nada nestes lugares é realmente antigo, mas todos reflectem a era industrial da cidade, uma parte da história de Londres, que sem eles, cairia no esquecimento.” Os ensaios cinematográficos de Patrick Keiller, LONDON, ROBINSON IN SPACE e o recente ROBINSON IN RUINS, desenham um mapa não-linear da evolução história e política da cidade de Londres e do Reino Unido em geral. O extraordinário retrato que Keiller faz de Londres re-imagina a cidade através das explorações do “investigador” Robinson, que nunca vemos, e do seu igualmente invisível companheiro, o narrador do filme (Paul Scofield), “tentando conjugar duas linhagens de pensamento crítico: por um lado, a literatura urbana de Poe, Baudelaire, Louis Aragon, Walter Benjamin, entre outros; por outro lado, as visões diversas do declínio do capitalismo inglês, em particular a ideia de que a Inglaterra é uma economia em decadência e atrasada por nunca ter tido uma revolução burguesa de sucesso” (Patrick Keiller).